Geração Z e o Mercado de Trabalho: Choque de Realidade ou Sintoma de um Modelo Quebrado?
- cdl455
- 20 de abr.
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Por Vinícius Brandão – Presidente da CDL de Porto Seguro e Diretor Estadual da ABIH-BA

Relatos que chegaram até nossa redação nas últimas semanas revelam um cenário cada vez mais comum entre empregadores, gestores públicos e empresários de diversos setores: jovens da Geração Z, aqueles nascidos entre meados dos anos 1990 e 2010, estão ingressando no mercado de trabalho com posturas que desafiam as normas tradicionais de responsabilidade, hierarquia e comprometimento.
Em uma repartição pública do interior baiano, por exemplo, um jovem aprovado em concurso se apresentou no dia da posse, mas informou que não ficaria no cargo, pois "a mãe dele queria trabalhar no lugar para que ele pudesse estudar com mais tranquilidade". Em outro caso, uma candidata a auxiliar de classe afirmou, sem rodeios, que não trabalhava às sextas-feiras porque “sextou”. Já uma jovem recepcionista requisitou fazer home office em dias em que “não estivesse disposta a sair de casa”, mesmo com a função exigindo presença física para atendimento ao público.
Esses episódios, que à primeira vista parecem anedóticos, refletem um conflito geracional mais profundo. Segundo levantamento da consultoria Robert Half (2024), 76% dos jovens entre 18 e 28 anos priorizam bem-estar e flexibilidade sobre estabilidade e carreira a longo prazo. Para muitos deles, o trabalho não é o centro da vida, mas sim um meio para viabilizar experiências — o que inclui tempo livre, saúde mental e propósito.
No entanto, a mudança de paradigma tem causado ruídos. Um relatório da McKinsey & Company (2025) mostra que 43% das empresas brasileiras relataram dificuldades em encontrar jovens com habilidades comportamentais básicas como pontualidade, iniciativa e senso de responsabilidade. Muitos empregadores se veem diante de jovens que não sabem utilizar transporte público, que não compreendem a lógica de metas coletivas ou que pedem desligamento após “atingirem suas metas pessoais” antes mesmo do final do ano.
O sociólogo Luiz Felipe Pondé, em artigo recente publicado na Folha de S. Paulo, alertou para o fenômeno da “infantilização crônica”. Para ele, parte dessa geração foi superprotegida por famílias que evitaram o enfrentamento de frustrações e dificuldades, criando adultos que esperam do ambiente profissional o mesmo tipo de acolhimento incondicional da infância.
Ao mesmo tempo, especialistas como Daniela Diniz, pesquisadora da FGV, defendem que o problema não está apenas nos jovens, mas na rigidez das estruturas tradicionais. “A Geração Z não quer repetir o modelo de seus pais. O que muitos interpretam como falta de comprometimento é, na verdade, recusa a um sistema exausto e sem propósito”, afirmou em entrevista à Exame.
Fato é que o modelo de gestão tradicional precisa ser urgentemente repensado. Segundo dados da PwC (2025), empresas que oferecem ambiente de escuta, propósito, autonomia e horários flexíveis conseguem reter 60% mais talentos dessa nova geração do que aquelas que insistem em padrões antigos.
Caminhos Possíveis
1. Educar para a responsabilidade: Programas de estágio e treinamento devem incluir não só habilidades técnicas, mas também noções de ética, autonomia e cidadania profissional.
2. Gestores mais adaptativos: O papel do líder precisa evoluir. Autoridade agora é construída com empatia, diálogo e clareza, não com imposição.
3. Ambientes com propósito: Jovens se conectam com causas. Empresas que comunicam seus valores e impacto social conseguem maior engajamento.
4. Mentorias intergeracionais: Promover a troca entre veteranos e iniciantes é uma ponte poderosa para harmonizar cultura, experiência e inovação.
Estamos diante de um impasse que não pode ser ignorado: ou ouvimos e compreendemos as novas expectativas profissionais ou perderemos talentos que simplesmente não aceitam mais trabalhar como se estivéssemos em 1990. A geração Z, com todos os seus excessos, está nos obrigando a rever o que realmente significa trabalhar bem.
Transformar o mercado de trabalho em um ambiente de aprendizado, respeito e equilíbrio pode ser a chave para reconectar essa nova geração aos valores essenciais do trabalho — sem abrir mão da inovação que eles trazem.
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